domingo, 2 de maio de 2010

Eles comem tudo - Episódio 3

Finalmente percebi porque globalmente andamos todos na merda. Passámos a trabalhar para uma coisa chamada indicadores. Basicamente são análises estatísticas com base em dados que nunca ninguém percebe muito bem de onde foram extraídos e se as contas batem certo ou não. O que importa são os tais valores baterem dentro do intervalo estipulado como aceitável.

E porque o importante são aqueles números, e a pressão se centra toda aí, o pessoal quando tem dificuldades em cumprir com o objectivo, sente a tentação de alterar um pouco a coisa para não parecer mal a quem nos vai pagar pelo nosso serviço.

Na empresa onde trabalho, após ter sido substituído o responsável pelo contrato, veio um tipo com umas ideias "novas". Na realidade, trouxe ideias à antiga. Fazer bem e à primeira, apostar na competência e na qualidade do serviço, e bater-se com o cliente para termos espaço para fazer as coisas como devem ser feitas. Nem por milagre, passados cerca de 4 meses as coisas estão a dar frutos. O final do mês era sempre um corropio para cumprir metas. Agora estamos a ter melhores resultados operacionais e muitissimo menos stress. E porquê? Retirámos aos indicadores a classificação de todo-poderoso.

Continuamos a depender deles, mas já não são a coisa mais importante. As estatísticas acarretam algumas vantagens, mas um problema enorme também. São facilmente manipuláveis sem que a realidade tenha sofrido as melhorias que lá indicam. E isto serve sobretudo para enganar boa parte dos parvalhões que se encontram nos locais de responsabilidade das empresas e também do país, a mandar no que não percebem e pior que isso, sem deixarem trabalhar quem sabe.

Com indicadores, qualquer babuíno finge saber como se gere uma empresa. E supostamente, sem necessitar de levantar o cu da cadeira e ir ao terreno verificar se o que está no papel corresponde à realidade. Os números não mentem... mas as pessoas que os escrevem podem mentir, certo?
Já devem ter reparado que gosto muito de ditados populares, e um dos que mais gosto é este: "O olho do dono engorda o cavalo".

A nível global, toda a gente usa indicadores. E porquê? Começo a acreditar que é porque somos todos governados por um conjunto de bestas, principescamente bem pagas, que da horta não percebem nada, mas sabem exigir que o gajo que puxa a enxada dê cabo das costas para eles terem as batatas no prato.

Ou seja, foi preciso chegar um puto ranhoso acabado de sair da faculdade para que o mundo soubesse para onde ir e como se governar. Como será que nos governámos até agora? Como será que tinhamos as batatas com o estupido da enxada a trabalhar com ela num angulo com 5º de desvio da inclinação optima? Parabéns doutor, descobriu uma coisa importante. É pena é que para estudar isso tudo tenha ocupado o zé da enxada a tal ponto que não houve tempo para semear, e este ano não haverão batatas. Vamos ter fome, mas para o ano que vem já sabemos como fazer correctamente. No entanto, no gráfico, a produção está bem e recomenda-se. E fazem-se as vendas, mas nuncaninguém receberá estas batatas.

Estamos dependentes dos números como nunca estivemos. Passámos a ser escravos da matemática, que antes era uma boa ferramenta, e agora é um empecilho quando as contas não batem no que esperávamos. Não é preciso muito para perceber onde foi que se errou; perdemos a vergonha e a seriedade. Assisto a um sentimento de facilitismo no seguimento da manada: "Toda a gente faz o mesmo, todos roubam quando podem, todos fogem ao fisco, todos mentem, só eu é que vou ser sério e meter a cabeça no cepo?"

Um homem vale tanto quanto a palavra que empenha ao comprometer-se com alguém. Hoje é raro o indivíduo que honra a sua palavra sem ser por medo de ser penalizado, apenas porque se trata da atitude certa para um homem de vergonha na cara. As grandes cidades promovem o anonimato, e quando as pessoas não receiam ser apontadas na rua, mais facilmente se desprendem dos seus compromissos. Alguns no entanto, são conhecidos por toda a gente como trafulhas, mas passeiam-se com as suas grandes barrigas como se nada fosse, agindo como se o mundo lhes devesse tudo. Perspectivas...